sábado, 22 de setembro de 2018

Nossos dramas quotidianos

Fall, Bas Jan Ader




Nossos dramas quotidianos
não contam
na milícia dos dias.

Iguais às nuvens,
as noites vêm e vão
num redondel ou tubo.
E os revezes são núcleo.
Qualquer gota
nos filtra.
O extravio
é a nossa identidade.
Nosso número.

Tudo sucede
a tudo
e nós, humanos,
não nos sucedemos.
Nos sucedem.
E o sangue
é a cal
do sangue,
sua província.

Só vinga
o que adubamos
com folhas de abandono.

Tábuas de rebelião.
Tábuas de dor,
nós somos.
Tábuas, tábuas
no universo inviável.

Tudo sucede
 a tudo.
Sem vestígio.

Insubmissos,
nosso amor
remonta aos astros.
E é o desequilíbrio.

Carlos Nejar, Somos poucos, 1976