sábado, 24 de novembro de 2018

Tentativa de resenha: “Paterson”, Jim Jarmusch, 2017

(Paterson, Jim Jarmusch, 2017)

Marco,

em Paterson, filme sobre o cotidiano de um motorista de ônibus que também escreve poemas, as coisas estão sempre projetadas umas sobre as outras. Os sonhos de Laura, esposa do protagonista, logo de manhã se projetam sobre a realidade: quando ela sonha com gêmeos, Paterson passa a vê-los pela cidade. Os próprios gêmeos, inclusive, são a projeção um do outro, uma estrutura aparentemente espelhada. Além disso, quando o motorista observa sua caixa de fósforos, logo em seguida uma descrição dela é feita num de seus poemas. Assim, da mesma maneira que a realidade se projeta no texto, como neste último caso, o texto se projeta na realidade: logo que terminamos de ler os versos sobre os fósforos, aparece escrita num muro a palavra “fire”.

O cachorro do casal é representado em pinturas pela casa, do mesmo modo como os cereais circulares que Paterson come antes do trabalho transformam-se em estampas geométricas pintadas por sua esposa. Aliás, ela reproduz suas estampas em diferentes plataformas: cortinas, vestidos, cupcakes. No detalhe, até o nome do protagonista é o nome da cidade, ou o nome da cidade é o nome do protagonista, além de ser o título da película. Quando o personagem escreve, imagens se sobrepõem na tela, junto com as palavras. Por fim, a cachoeira, tema do poema da garotinha, de que você tanto gosta, projeta-se no pequeno quadro na parede da casa, projeta-se, enorme, na paisagem da cidade.

Esse mecanismo de sobreposição também pode ser lido como a aproximação entre dois planos distintos, duas diferentes esferas de sentido (o sonho e a realidade, a realidade e o texto, o indivíduo e a cidade). Em literatura, a esse movimento dá-se um nome: metáfora. Portanto, assim como Paterson, o motorista, Paterson, o filme, também escreve, dessa vez com imagens. Quem disse que cinema não faz poema?

           
Ah,
morar junto é também projetar-se.
Visto suas roupas, você veste as minhas,
deitamos um em cima do outro sobre a cama,
por vezes meus planos de decoração são também os seus,
sem que a gente saiba.
A todo momento aproximamos duas diferentes esferas de sentido:
eu e você.
Quem disse que esta casa não faz metáfora?