Vasculhando a locadora de filmes em
busca de algum que pudesse me dizer algo substancial e estivesse latejando de
dor como eu, encontrei o belíssimo Fora
do Mapa, dirigido por Campbell Scott, de 2003.
O
filme se passa no deserto do Novo México, EUA, e trata da dor humana, esperança,
nudez física e da alma e, sobretudo, da simplicidade. Conta a história de uma
família: mãe descendente indígena, pai em profunda crise depressiva, o melhor
amigo sempre presente, a filha de doze anos entendida das coisas e um fiscal do
imposto de renda que se encanta com a beleza de tudo ali. Porque, sim, há
beleza no deserto, nas lágrimas infindáveis do pai, na força quase selvagem da
mãe e no horizonte, a “curva que separa o oceano do céu”, mesmo que esse
oceano, no filme, seja composto de areia.
Assim
como o fiscal – que viera cobrar os impostos atrasados e acabou ficando com a
família – encantou-se com toda essa beleza ingênua, é de se esperar que nós,
espectadores, nos apaixonemos também. A família não tem TV, dinheiro, telefone;
vive do que caça, planta e encontra no depósito de lixo. A casa possui, no
lugar de vizinhos, poeira. E é nesse ambiente inóspito que floresce toda a
poesia do filme.
Os
personagens e a secura do cenário são um só. A depressão do pai não possui
motivo revelado, talvez porque não haja uma razão única, mas um montante delas,
que de tantas, parece impossível nominá-las. As nossas dores são assim,
acumuladas. E parece que todos no filme vivem a própria tristeza, talvez menos
intensa como a do patriarca, mas latente ainda que calada. A mãe se vê na
responsabilidade de cuidar de tudo enquanto o pai emudece; a filha está cansada
da vida isolada e quer um contato exterior; o amigo já não sabe o que fazer
para tirar o melhor amigo do buraco; o fiscal, agora membro da família, viu a
mãe morta na infância. O diálogo entre este e o pai é bem contundente:
“
– Já teve depressão? – o pai pergunta.
– Eu nunca não tive. ”
Lindo.
No entanto,
apesar de toda a tristeza desértica, existe um barco “navegando” por lá. Apesar
de toda a depressão presente, “há telescópios em toda parte”. E em momento
nenhum, o espectador sente compaixão pela família, não há razão, pelo
contrário, queremos o mesmo que eles. Pois “a vida é simples”, o filme avisa. E
constatamos isso quando ele termina e seguimos vivendo, olhando a beleza de um
sorriso sincero, sentindo o amor, energia liberada num afago materno, e a brisa
fresca no final da tarde, depois de um longo dia quente.
(Fora do mapa, Campbell Scott, 2003)