sexta-feira, 17 de outubro de 2014



“ – Oh! É que eu te amo! – recomeçava ela. – Amo-te a ponto de não poder viver sem ti, sabes? Tenho às vezes desejos de ver-te novamente quando todas as fúrias do amor me desesperam. Pergunto a mim mesma: ‘Onde está ele? Talvez esteja falando com outras mulheres. Elas lhes sorriem, ele se aproxima...’ Oh! Não, não é verdade, não gostas de nenhuma? Há outras mais bonitas, mas eu, eu sei amar melhor! Sou tua serva e tua concubina! Tu és meu rei, meu ídolo! És bom, és belo, és inteligente! És forte!

Rodolphe a ouvira tantas vezes dizer tais coisas que elas nada mais tinham de original para ele. Emma assemelhava-se a todas as suas amantes; e o encanto da novidade, caindo pouco a pouco como uma veste, deixava ver a nu a eterna monotonia da paixão, que tem sempre as mesmas formas e a mesma linguagem. Aquele homem tão experiente não distinguia mais a diferença dos sentimentos sob a igualdade das expressões. Porque lábios libertinos ou venais lhe haviam murmurado frases semelhantes, ele mal acreditava em sua candura; era preciso, pensava, descontar suas palavras exageradas, escondendo as afeições medíocres: como se a plenitude da alma não transbordasse algumas vezes nas metáforas mais vazias, já que ninguém pode algum dia exprimir exatamente suas necessidades ou seus conceitos, nem suas dores, já que a palavra humana é como um caldeirão rachado, no qual batemos melodias próprias para fazer dançar os ursos, quando desejaríamos enternecer as estrelas.”


(Gustave Flaubert, Madame Bovary, 1857)

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