Depressão da velhice
“Recebi dois e-mails que me deram grande alegria. Um deles, de uma mulher que me
falava de sua mãe. O outro, também de uma mulher, falava-me sobre sua avó. A
primeira me contava de sua mãe, já velha, como eu, que estava mergulhada numa
profunda melancolia. Passava os seus dias com olhar perdido. Certamente pensava
no fim que se aproximava. Nunca havia lido um único livro em toda sua vida. Na
tentativa de tirar sua mãe da depressão, começou a ler para ela alguns dos meus
textos. Um milagre aconteceu. Ela ressuscitou. Começou a ler e agora não queria
parar. A outra me contou algo semelhante. Sua avó vivia a tristeza de duas
perdas: do marido e da filha. A neta teve a mesma ideia: começou a ler para a
sua avó. O mesmo milagre aconteceu. Agora não parava de ler. O que teria acontecido?
Talvez eu, velho, tivesse colocado em palavras coisas que estavam nas suas
almas. A grande tristeza da velhice é a solidão. Lembro-me de uma tola,
tentando consolar um velho de 92 anos que só vivia de saudades: ‘É preciso
esquecer o passado! É preciso olhar para a frente!’. Mas que ‘para frente’
existe na alma de um velho de 92 anos? Talvez uma coisa simples e barata que
possa ser feita para os velhos seja ler-lhes literatura, quem sabe poesia. A
literatura nos liberta da solidão. E traz alegria.”
(Rubem Alves, Ostra feliz não faz pérola, Ed. Planeta
(2008), página 252).
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