(Onde vivem os monstros, Spike Jonze, 2009 - o melhor dos meus melhores filmes, mais uma vez, incansavelmente.)
quarta-feira, 26 de setembro de 2012
sábado, 15 de setembro de 2012
Uma noite com o Morrissey
Please, save your
life.
Uma noite com o Morrissey
é sempre noite
de gemidos afinados.
segunda-feira, 3 de setembro de 2012
O que é a poesia?
“ – Poesia! Poesia! – murmurou
Bertram.
– Poesia! Por que pronunciar-lhe à virgem
casta o nome santo como um mistério, no lodo escuro da taverna? Por que
lembrá-la a estrela do amor à luz do lampião da crápula? Poesia! Sabeis o que é
a poesia?
– Meio cento de palavras sonoras
e vãs que um pugilo de homens pálidos entende, uma escada de sons e harmonias
que àquelas almas loucas parecem ideias e lhes despertam ilusões como a lua as
sombras... Isto no que se chama os poetas. Agora, no ideal, na mulher, o
ressaibo do último romance, o delírio e a paixão da última heroína de novela, e
o presente incerto e vago de um gozo místico, pelo qual a virgem morre de
volúpia, sem saber por quê...
– Silêncio, Bertram! (...) A poesia, eu t´o
direi também por minha vez, é o voo das aves da manhã no banho morno das nuvens
vermelhas da madrugada, é o cervo que se rola no orvalho da montanha relvosa,
que se esquece da morte de amanhã, da agonia de ontem em seu leito de flores!
– Basta, Claudius: que isso que aí dizes
ninguém o entende: são palavras, palavras e palavras, como o disse Hamlet: e
tudo isso é inanido e vazio como uma caveira seca, mentiroso como os vapores
infectos da terra que o sol no crepúsculo irisa de mil cores, e que se chamam
nuvens, ou essa fada zombadora e nevoenta que se chama a poesia!
– À história! À história! Claudius, não vês
que essa discussão nos faz bocejar de tédio?”
(Álvares de Azevedo, Noite na taverna, L&PM Pocket, 1998,
páginas 59 e 60)
sábado, 1 de setembro de 2012
O homem do Estado
Dentro dos olhos de um homem do
Estado, o que há? Toda essa subordinação a uma máquina que mata, de onde vem? O
que fez com que as palavras amor e guerra se aproximassem? O que aconteceu com
a memória histórica do povo que aplaude os militares e posam para fotografias
ao seu lado? E as crianças, meu Deus, aguardam ansiosas o tiro ser detonado
pelo fuzil! O tiro que mata os pássaros e o vento passageiro, infantil. Estão
mortos a liberdade, a universidade, os meninos deste país.
O homem caminha automático como
se recebesse comandos de um controle remoto; o homem caminha ritmado, sua
expressão é dura, sua postura é séria e assusta (ou encanta!); ele é cruel no
olhar, pode matar se quiser, pode morrer se quiserem, ele marcha. E o soldadinho
de chumbo foi o seu sonho num dia de inocências. E a farda manchada de sangue,
sob as botas a causa da mancha, agonizante, foi o seu sonho de juventude; e se
conserva.
Roubaram sua infância,
venderam-lhe ilusões que nunca tivera. Nos olhos camuflados não há mais
brincadeiras nem sono tranquilo. O menino foi embora, banido. Em seu lugar
implantaram, como um programa pré-definido, o guardião de uma pátria
dissimulada. Ele não pode dormir sossegado, pois tem que proteger, sem ser
protegido e amar, sem amor de volta. Sua família se orgulha do morto. O Estado
ignora o cadáver obrigatório.
Reprogramaram a máquina humana.
No lugar do coração, a obediência fria. No lugar da inconstância da voz, o tom
grave de agora em diante. E o olhar paralisado, distante, sem hesitar, sem se
distrair, sem riso, sem lágrima, sem afeto, o que vislumbra? No horizonte
longínquo dos olhos haverá uma árvore solitária no alto de um morro de relva,
com sua sombra generosa e alguém sentado nela? Haverá um pássaro entre nuvens,
ou uma bolha que logo vive e se quebra? Haverá libertação e medo e humanidade,
ou apenas gaiolas, hinos, coluna ereta, silvos e falso heroísmo? O herói está
sendo forjado na argila despercebida. Reprogramaram a máquina humana. Cacem!
Prendam! Torturem! Matem! Gozem! Depois aplaudam o horror da vida.
O homem do Estado morrerá feliz.
Ele estará satisfeito por possuir um uniforme, um nome. Por toda a vida
defendeu sua nação dela mesma. O inimigo sempre esteve dentro de casa: sob sua
mira cega o próprio pé. Mas o homem do Estado não sabe do Estado. E está feliz
por não saber, feliz e morto. Sorriso nos lábios azuis e endurecidos; no punhal
cravado em suas costas, a bandeira do Brasil.
Na minha face escorre sozinha uma
lágrima. Ela é sólida de ódio. O homem é um exército. A morte dele um massacre.
Não existem lápides para o moço nem para o menino. Não há menção honrosa para o
olhar perdido. O que há dentro dos olhos cínicos do país é uma bandeira e uma
mentira. Dentro de mim a vontade de parar esse brinquedo que gira.
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