“Escrevo-te à medida de meu
fôlego. Estarei sendo hermética como na minha pintura? Porque parece que se tem
de ser terrivelmente explícita. Sou explícita? Pouco se me dá. Agora vou
acender um cigarro. Talvez volte à máquina ou talvez pare por aqui mesmo para
sempre. Eu, que nunca sou adequada.
Voltei. Estou pensando em
tartarugas. Uma vez eu disse por pura intuição que a tartaruga era um animal
dinossáurico. Depois é que vim ler que é mesmo. Tenho cada uma. Um dia vou
pintar tartarugas. Elas me interessam muito. Todos os seres vivos, que não o
homem, são um escândalo de maravilhamento: fomos modelados e sobrou muita
matéria-prima – it – e formaram-se então os bichos. Para que uma tartaruga? Talvez
o título do que estou te escrevendo devesse ser um pouco assim e em forma
interrogativa: ‘E as tartarugas?’ Você que me lê diria: é verdade que há muito
tempo não penso em tartarugas.”
(Clarice Lispector, Água viva, 1973)
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