sexta-feira, 24 de julho de 2015

quinta-feira, 23 de julho de 2015

"litogravura" ou material didático para controlar o ascendente em peixes



Mão de estátua.
Templo. Coluna. Arco de triunfo.
Mil duzentos e cinquenta.
Qualquer pedra na Europa
é suspeita de ser
mais do que aparenta.

Felizes as pedras da minha terra
que nunca foram senão pedras.
Pedras, a lua esfria
e o sol esquenta.

- P. Leminski

segunda-feira, 20 de julho de 2015

o quarto de letícia

Inscrever pela primeira vez caneta azul sobre poemas. Perder medo de macular livro com tinta – e digitais. Encontrar letícia perdida na página seguinte. Anotar endereço de hoje à noite na página vinte e cinco. Primeira mácula. Reencontrar letícia em páginas não tão insuspeitas.












viçosa, minas gerais, junho de 2015

sexta-feira, 10 de julho de 2015

Aula de descrição, com James Joyce



"O sr. Duffy tinha horror a tudo o que evidenciasse desorganização física ou mental. Um médico medieval teria dito que era um saturnino. O rosto, que contava toda a história dos anos, tinha a mesma cor marrom das ruas de Dublin. Na cabeça comprida e um tanto avantajada cresciam cabelos pretos e secos, e o bigode castanho-claro  não chegava a encobrir a boca inamistosa. As maçãs do rosto também conferiam ao semblante uma expressão dura; mas não havia nenhuma severidade nos olhos, que, ao ver o mundo por sob as sobrancelhas castanho-claras, davam a impressão de um homem sempre disposto a reconhecer um instinto redentor nas outras pessoas, apesar das frequentes decepções. Morava a uma certa distância do corpo, observando os próprios atos com duvidosos olhares de esguelha. Tinha um estranho hábito autobiográfico que de tempos em tempos levava-o a compor mentalmente uma breve frase a respeito de si próprio com um sujeito na terceira pessoa e um predicado no passado. Nunca dava esmolas a mendigos e caminhava com passos firmes, com uma robusta aveleira.

(...)

Não tinha companheiros nem amigos, igreja nem credo. Vivia uma vida espiritual sem nenhuma comunhão com outras pessoas, fazendo visitas a parentes no Natal e acompanhando-os ao cemitério quando morriam. Cumpria esses dois deveres sociais em nome da antiga dignidade, porém não fazia mais nenhuma concessão às convenções que regem a vida cívica. Permitia-se imaginar que em certas situações seria lícito roubar o banco onde trabalhava, mas, como essas situações nunca se concretizavam, levava uma vida regrada - uma história sem nenhuma aventura."

Autor: James Joyce
Conto: Um caso doloroso
Obra: Dublinenses
Ano: 1914

terça-feira, 7 de julho de 2015

para colar nos postes

“Em suma, tanto naquelas leituras se enfrascou, que passava as noites de claro em claro e os dias de escuro em escuro, e assim, do pouco dormir e do muito ler, se lhe secou o cérebro, de maneira que chegou a perder o juízo. Encheu-se-lhe a fantasia de tudo que achava nos livros, assim de encantamentos, como pendências, batalhas, desafios, feridas, requebros, amores, tormentas, e disparates impossíveis; e assentou-se-lhe de tal modo na imaginação ser verdade toda aquela máquina de sonhadas invenções que lia, que para ele não havia história mais certa no mundo. (...)

(...) parecer-lhe convinhável e necessário, assim para aumento de sua honra própria, como para proveito da república, fazer-se cavaleiro andante, e ir-se por todo o mundo, com as suas armas e cavalos, à cata de aventuras, e exercitar-se em tudo em que tinha lido se exercitavam os da andante cavalaria, desfazendo todo o gênero de agravos, e pondo-se em ocasiões e perigos, donde, levando-os a cabo, cobrasse perpétuo nome e fama. (...)

Posto a seu cavalo nome tanto a contento, quis também arranjar outro para si; nisso gastou mais oito dias; e ao cabo disparou em chamar-se Dom Quixote."



(Miguel de Cervantes, Dom Quixote de la Mancha, 1605)