terça-feira, 25 de junho de 2013

Navegador só

Trancado em meu quarto me sinto seguro. Minhas paredes, meus livros e perfumes, o espelho e o que escrevo formam uma âncora e um paradoxo. Estou tão próximo e quero me afastar de tudo que me diz: é você. Tudo em meu quarto sou eu. Do cais do meu porto posso enxergar minha vulnerabilidade nítida. Aquele homem está vulnerável a si. Aquele homem ali com uma âncora de mentira, vê? Ancorando no vazio, aquele homem perdido, vê?  

Fora da redoma com cortinas, há os outros e há também o mundo. Por instantes saio esperançoso, forço sorrisos. Mas logo estou correndo dos tubarões, à deriva. O mar não consegue me engolir, eu nado e nado até chegar de novo ao quarto, assustado, açoitado por uma imensidão que não toco: sentimento de pertencimento, ao contrário. Arfando tranco de novo a porta, posso respirar sossegado. Mas respiração e pensamento também são dor e incerto, inseto. E o mar é aqui dentro. Não consigo fugir de mim, estúpido.

Naquela noite, o encontro com a mulher aflita, calada e tímida me fez chorar na sua frente. Eu a vi, solitária, aprendendo a nadar já velha. E seu desespero surdo chegou até mim, ou emanou do meu peito e logo encontrou repouso. Na frente da mulher no meio do mar, na frente do homem com um b arco, choramos, qual imagens refletidas. Apesar dos olhos piedosos, ninguém pediu nem ofereceu lugar na embarcação vazia. Continuamos sozinhos, navegando, tentando ensandecidos, inúteis, mudos, mortos, não afogar. 

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